Ausculte-se em casa.... (artigo noticias do douro)

“Há tantas coisas no mundo que eu gosto e sem as quais não posso viver. São tantas, tantas, que penso e aposto ser capaz de as saber dizer.”
Um verso tão simples cantado por um projecto inovador em Portugal que é Jazz cantado por Crianças. Mais concretamente, um CD com 12 clássicos de Jazz cantados e adaptados para crianças e jovens. A ondulação da sonoridade em causa, e mais pormenorizadamente, o verso supra mencionado fez-me pensar nessas coisas que eu gosto e sem as quais não posso viver. Peguei num bloco de notas e comecei a escrever uma extensa lista desde a música, os livros, o mar, o café e porque não viagens. Paralelamente aos bens materiais, a minha lista também inclui a profissão, os amigos, a felicidade e a saúde.
Falando desta última, as novidades no campo da saúde, no nosso País, são estrondosas. Somos um País com deficit de enfermeiros, médicos e mesmo condições hospitalares, mas, conforme pude ler nas notícias, Portugal poderá ser dos primeiros países onde os hospitais oferecem um sistema denominado Telepresença. O supra sistema permite que um doente seja observado por um médico à distância de um clique, ou seja, um utente pode ser consultado pelo seu médico de família através de um sistema informático onde através de câmaras com imagem e som em alta definição, o médico e o doente aparecem em tamanho real. Segundo fontes noticiosas, a grande vantagem do sistema é que o doente pode auscultar-se sozinho, realizar a apalpação sozinho e os resultados dos exames são posteriormente enviados ao médico para este processar a prescrição. No fim de ler a notícia, entendi que este sistema é caricato, face às necessidades sociais e económicas deste país. No entanto, devido aos meus parcos conhecimentos nesta área, decidi partir para o terreno. “Saltei” do escritório para a realidade da saúde através da leitura de estudos, de conversas com profissionais e, acima de tudo, ouvindo. Entre as notas da partitura da saúde, encontrei uma pausa, Ana Rita Cavaco, candidata a Ordem dos Bastonários dos Enfermeiros. Não resisti a uma conversa com a própria, sentadas a olhar o rio Douro e trocar impressões sobre este sistema nacional de saúde que tanta tinta faz correr em Portugal. Não resisti e iniciei o diálogo abordando a greve dos enfermeiros que teve por base a discriminação salarial. Cheguei mesmo a colocar a questão de estarmos perante um ressentimento classicista em relação aos médicos. No entanto, rapidamente entendi pelas suas palavras que os enfermeiros desenvolvem intervenções autónomas ou interdependentes prescrevendo cuidados de enfermagem. Aliás, como referiu a candidata Ana Rita Cavaco: “Veja-se a este respeito o artigo artº 8º, ponto 3, Dec-Lei nº161/96 que menciona que os enfermeiros têm uma actuação de complementaridade funcional relativamente aos demais profissionais de saúde, mas dotada de idêntico nível de dignidade e autonomia de exercício Profissional ". Acrescentou ainda que: “Em vez de atirar as culpas para os enfermeiros, a ministra devia pedir desculpas aos portugueses pela falta destes profissionais, pelos cuidados de enfermagem que encerram nos centros de saúde e pelos dois enfermeiros que, na maioria das vezes, estão sozinhos nos hospitais com 30 ou 40 doentes a seu cargo. Peça desculpa por isto ao país!"Contudo, rapidamente, a esfera da conversa saltou do enfermeiro para o sistema nacional de saúde e a mesma referiu que: “Vale a pena pensar porque os EUA tentam ter um SNS e nós tentamos desfazer o nosso! Vale a pena perceber o que aconteceu em Inglaterra, privatizaram até não poderem mais e agora o Estado "compra" de volta as Instituições de Saúde.”
Com o pôr-do-sol a aproximar-se, a conversa chegou ao fim.
Mas estes assuntos continuaram a “martelar” os meus pensamentos. Não satisfeita cheguei a casa e procurei mais sobre a matéria. Li variados estudos, notícias e artigos sobre a saúde em geral, mesmo a nível internacional, e rapidamente conclui que a minha visão está correcta quando penso e defendo que este sistema inovador vale zero na percentagem da evolução da saúde em Portugal. Médicos, enfermeiros, professores e outros profissionais fizeram-me entender que pensar na saúde é pensar num equipa de profissionais multi-disciplinar cujo único propósito é olhar para o cidadão e reabilitá-lo de forma digna e respeitosa, no seu todo, integrado quer no seu seio familiar quer na sua comunidade. Será uma visão demasiado utópica? Talvez sim, talvez não. Todavia se metade dos altos/médios quadros deste país a tivesse, hoje o nosso SNS era mais correcto, equilibrado e justo com todos os profissionais de saúde e com todos os doentes que diariamente acorrem aos Centros de Saúde. Mesmo sem contabilizar aqueles que tantas vezes se deslocam só para ouvir uma voz amiga ou para afastar a solidão. Por isso, Sra. Ministra, esqueça o fenómeno “ausculte-se em sua casa” e defenda a frase seja “auscultado com dignidade.”
Enfim, o problema deve ser mesmo de audição pois, se a Ministra ouvisse os nossos profissionais de saúde seria tão simples catapultar o SNS para níveis máximos de eficácia, exigibilidade, qualidade e dignidade. Não resisto a terminar num tom de jazz pois conforme canta Billie Holiday: “The fundamental things apply As time goes by” (As coisas fundamentais aplicam-se com o passar do tempo)

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